segunda-feira, 26 de março de 2012

Algumas considerações sobre o caso Renato Rocha, da Legião Urbana

A repercussão em torno da história de Renato Rocha, ex-baixista da Legião Urbana e que hoje é morador de rua, me fez pensar em uma série de questões que estão sendo minimizadas em detrimento de um sensacionalismo fácil, de uma visão muito maniqueísta das coisas, em minha opinião.

Para quem não está acompanhando o caso, Negrete (como o músico era conhecido) foi tema de uma reportagem de cerca de 15 minutos no programa Domingo Espetacular, da Record. A matéria foi ao ar ontem à noite e, desde então, Renato Rocha vem despertando discussões acaloradas na internet. A maior parte dos comentários o coloca como vítima, como injustiçado num país sem memória.

A matéria, para mim, ajudou a reforçar essa imagem. A equipe do Domingo Espetacular foi ao encontro de Negrete, que aparece sentado num meio-fio de uma rua no Rio de Janeiro. Ele estava de camisa vermelha, bermuda, chinelos e boné. Mais velho e mais gordo, quase não fazia contato visual – logo ele, a figura mais esfíngica da Legião, cujo olhar incisivo e certeiro tanto dizia da sua alma punk.

A partir dessa apresentação, vemos um pouco de tudo, o mais do mesmo daquela matéria feita pra chorar: a repórter mostra um fã que o reconhece nas ruas e pede autógrafo; vemos imagens de Negrete andando de chinelo por uma enorme poça d´água numa rua, carregando seus pertences num saco; vemos o hotel em que ele guarda o baixo que comprou há três meses. A repórter pede que ele toque uma música e ele tenta relembrar os acordes de Ainda é Cedo, meio destreinado. A lembrança ainda está ali, mas distante, como um fantasma do que ele já foi.

Enquanto isso, em Brasília, a repórter Venina Nunes visitava o escritório de advocacia do pai de Negrete, um senhor de seus 80 anos. O pai disse que há muitos anos não vê o filho e que as drogas o levaram a essa situação.

O programa informa que o músico vive com apenas R$ 900 de direitos autorais pagos pelo ECAD, o que é realmente muito pouco se pensarmos que ele fez parte da maior banda do movimento Rock Brasília, que vende milhares de discos até hoje. Se pensarmos que o ECAD é a maior caixa de pandora dos direitos autorais, a quantia fica mais suspeita ainda, mas isso são outros quinhentos e rende uma discussão à parte.

Bom, a reportagem termina dizendo que os ex-companheiros de banda, Dado Villa-Lobos e Marcelo Bonfá, foram procurados e não quiseram dar entrevista.

Diante de tudo isso, algumas perguntas ficaram na minha cabeça:

  • Como a pessoa ganha R$ 900 todo mês e está morando na rua, mendigando? É pouco, mas é mais que um salário mínimo;

  • Como um morador de rua compra um baixo novinho?;

  • Por que Negrete não busca ajuda da família, que parece estar numa situação boa em Brasília?

Essas foram apenas algumas perguntas que a reportagem me despertou. O que acho, depois de pensar em todos os lados da questão, é o seguinte: não dá para culpar os outros (sejam Dado e Bonfá, seja o ECAD, seja o sistema, seja a indústria cultural ou o que for) pela situação em que Renato Rocha está. É sempre muito mais fácil nos colocarmos no lugar de vítima, como se estivéssemos sofrendo por conta de coisas que conspiraram conta nós, em vez de olharmos para o que fizemos.

Nesse caso específico, a real é direta e certeira: Negrete está nessa situação porque ele se colocou nela. Simples assim. Ação e reação. Todos sabemos que Renato Rocha era o mais doidão da banda, que se orgulhava por ser verdadeiramente punk, ao contrário dos “playboyzinhos” que rasgavam a calça e aprendiam a tocar igual a cara deles só pra ter bandinha, como ele costumava definir os outros meninos. Renato embarcou forte nas drogas e começou a chegar atrasado, perder ensaios, perder vôos etc. Até que foi expulso da banda por Renato Russo. Depois disso, poderia ter aproveitado a notoriedade que ganhara na Legião e montar nova banda. Poderia ter ido trabalhar em outra coisa. Poderia ter virado professor de baixo. Sei lá. Q-u-a-l-q-u-e-r c-o-i-s-a.

O que eu quero dizer é: se te expulsam da banda, é claro que você fica puto, se sente injustiçado, enfim. Mas você tenta se reerguer, tenta buscar outras alternativas. O que me parece é justamente que Renato Rocha não buscou. Ficou ali, vivendo de direitos autorais, pirando, continuou a usar drogas. Até que chega uma hora que fica difícil. Ele não me pareceu, pela reportagem, alguém que está querendo loucamente sair das ruas. Parece estar meio passado, meio em outro plano.

Talvez ele só queira que alguém o resgate. Em determinado momento da matéria, ele diz à repórter que quer voltar a tocar, mas que está esperando uma oportunidade. Bingo. As oportunidades certamente virão com a matéria. Aposto que vão chover convites para entrar em bandas. Resta saber se ele vai agarrar ou se novamente vai se sabotar, como vem fazendo com suas escolhas. Negrete precisa querer verdadeiramente ser resgatado. Senão será mais do mesmo. De novo.

sexta-feira, 9 de março de 2012

Iansã e Oxossi

- Mas calminha desse jeito?

Não é preciso alarde para quem sabe, no íntimo, ter a força das tempestades e o profundeza das raízes das árvores. Como você, sou filha dos raios de Iansã. Aprendi a falar com o barulho dos trovões. Fui alfabetizada assim, entre a explosão e o afago. Sempre um pouco doce, um pouco brava. Muito dos dois. Sempre muito. Sempre branda. Na mesma medida em que incendeio, posso soprar a brisa das chuvas da manhã. Sei a estrada para ambos os estados de alma. E há todo o meio do caminho. O entre. Talvez por isso eu mude tanto, pelo infinito das possibilidades. Mudo com a velocidade de um lampejo. Se o meu olhar conforta, pode cortar na mesma medida. Sou calma, sim, como você viu nesse retrato precipitado de mim. Mas sou filha de Iansã e Oxossi. A nossa diferença é que guardo minhas tempestades para quando me convém. Não sou de espalhar temporais em qualquer lugar, não preciso dos holofotes. Gosto do palco, mas também gosto da sombra. Sou dada a cantos, à acolhida de ficar quieta, observando. Sei a beleza e a força do silêncio. De modo que, neste nosso breve contato, eis o que você precisa saber sobre mim: ser forte não é só empunhar a espada, mas saber dançar com ela, junto ao coração.

18 dias no Japão

Foram 18 dias de sonho e muitas caminhadas pelo Japão. Começamos por Tokyo, onde ficamos por 4 dias. A ideia era entrarmos em contato com c...